DADOS CLÍNICOS
Criança de um ano, sexo feminino, branca, procedente de Santa Catarina. Observado sopro cardíaco no primeiro mês de vida, porém manteve-se sem sinais clínicos até os três meses, quando iniciou quadro de cianose e hipotonia aos esforços e diminuição do ganho pôndero-estatural. BEG, hidratada, corada, dispnéia leve e cianótica ++/4, com saturação periférica de O2 de 60%. Ictus cordis sem alterações, ritmo regular em dois tempos, bulhas normofonéticas, sopro sistólico de ejeção intenso em borda esternal esquerda. Ausculta pulmonar simétrica, sem ruídos adventícios. Abdômen sem alterações. Extremidades com pulsos simétricos e boa perfusão.
ELETROCARDIOGRAMA
Ritmo sinusal, freqüência de 150 bpm. Eixo complexo QRS +120º, desviado para direita. Sobrecarga atrial e ventricular direita.
RADIOGRAMA
Índice cardiotorácico de 0,65. Arco médio escavado com aumento de câmaras direitas. Campos pulmonares com diminuição da perfusão periférica.
ECOCARDIOGRAMA
Situs solitus em levocardia. Conexão venoatrial anormal, junção atrioventricular com dupla via de entrada do ventrículo único tipo direito e valva atrioventricular única. Junção ventriculoarterial com dupla via de saída do ventrículo direito. Defeito do septo interatrial tipo ostium primum, estenose infudíbulo-valvar importante, com gradiente de 77 mmHg e presença de veia cava superior esquerda persistente.
DIAGNÓSTICO
A cineangiocoronariografia foi concordante com os achados ecocardiográficos, demonstrando a dupla via de saída de ventrículo único tipo direito e estenose pulmonar infundíbulo-valvar importante. A veia cava superior esquerda persistente drenava no seio coronário. O gradiente pressórico entre o ventrículo sistêmico e o tronco pulmonar era 70 mmHg e a pressão pulmonar média de 12 mmHg.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Considerando-se que o quadro clínico é característico de cardiopatia congênita com hipofluxo pulmonar, devem ser lembradas a tetralogia de Fallot, atresia pulmonar com comunicação interventricular, atresia tricúspide e cardiopatias complexas com fisiologia univentricular.
OPERAÇÃO
O Glenn bidirecional bicaval foi possível sem a necessidade de auxílio de circulação extracorpórea ou de derivação da veia inominada para o átrio direito ou tronco pulmonar. Toracotomia transesternal mediana, dissecção cuidadosa da veia cava superior direita, veia cava superior esquerda e ramos pulmonares. Ligadura da veia ázigos. Heparinização com 2mg/Kg. Desconexão da veia cava superior direita do átrio direito e anastomose término-lateral no ramo arterial pulmonar direito. Da mesma forma, à esquerda a veia cava superior esquerda foi anastomosada à artéria pulmonar esquerda. O tronco pulmonar foi submetido à bandagem severa, com o intuito de permitir fluxo anterógrado e desenvolvimento dos ramos pulmonares. A pressão nos ramos pulmonares foi medida durante o ato operatório, após a anastomose das cavas, e apesar do fluxo anterógrado era de 15 mmHg. Evoluiu bem no pós-operatório imediato, recebendo alta hospitalar com oito dias, em uso de ácido acetilsalicílico. O paciente deverá ser acompanhado ambulatorialmente para realização de operação tipo Fontan após os dois anos de idade.