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ARTIGO ORIGINAL

Remodelação cirúrgica da valva aórtica

Ronaldo D Fontes0; Herbert D. SALERNO0; Alfredo V. E. E. HIJO0; Alberto NAJJAR0; Luiz César N . SCALA0; Maria Cecília K. FARAH0; Gustavo J. V. COUTO0

DOI: 10.1590/S0102-76382001000300005

Resumo:

INTRODUÇÃO

O tratamento cirúrgico conservador da valva aórtica em pacientes com insuficiência valvar aórtica não tem resultado tão satisfatório quanto o da insuficiência mitral (1). Entretanto, as tentativas de preservação cirúrgica da valva aórtica são, na realidade, expressão das complicações que as próteses cardíacas valvares apresentam em sua evolução, tanto pelas limitações impostas aos pacientes que recebem próteses mecânicas, como pela possibilidade de reoperação para troca de prótese biológica que sofre processo degenerativo(2).

Assim sendo, métodos empregados na tentativa de preservação da valva aórtica devem ser considerados, padronizados e analisados a longo prazo. É o caso do presente artigo, que tem por objetivo relatar resultado de técnica de preservação da valva aórtica, utilizada primeiramente por GARAMELLA et al. (3), em 1958, e, posteriormente, abandonada.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

No período compreendido entre março de 1996 e julho de 1999 foram operados 15 pacientes portadores de disfunção valvar aórtica em nosso Serviço.

Quatro doentes tinham diagnóstico de insuficiência aórtica isolada, 2 com dupla disfunção aórtica associada à insuficiência coronária, 2 com doença da aorta ascendente, 4 com insuficiência aórtica e mitral, 1 com dupla disfunção aórtica e mitral, e 2 com insuficiência aórtica e insuficiência coronária. A idade dos pacientes variou entre 12 e 78 anos, sendo que 2 deles tinham idade inferior a 15 anos. Nove pacientes eram do sexo masculino.

O método empregado na correção cirúrgica da valvopatia aórtica foi denominado "Remodelação Cirúrgica da Valva Aórtica" e, conforme descrição de GARAMELLA et al. (3), consiste em utilização habitual de circulação extracorpórea, hipotermia moderada e infusão de solução cardioplégica nos óstios coronários. A válvula não coronariana é ressecada e é passado ponto ancorado nas comissuras correspondentes à válvula ressecada, de maneira que quando tracionado, torna a valva aórtica bivalvulada. O seio de Valsalva correspondente à válvula ressecada fica situado abaixo da "nova comissura". A parede da aorta torna-se evaginada, sendo suas bordas suturadas com monofilamento 5-0, continuamente, prosseguindo-se com a aortorrafia convencional (Figura 1).



RESULTADOS

Dos 15 pacientes operados no período, 6 foram submetidos à remodelação cirúrgica da valva aórtica como descrita no método, 2 foram tratados com remodelação e interposto enxerto tubular de pericárdio bovino, substituindo a aorta ascendente, outros 2 com remodelação da valva aórtica associada à revascularização do miocárdio, 1 com remodelação mais comissurotomia mitral e aórtica e os 4 últimos submetidos à remodelacão da valva aórtica e plástica da valva mitral (Tabela 1). Não houve óbito imediato. O tempo de circulação extracorpórea variou entre 47 e 122 minutos e o tempo de anóxia miocárdica entre 18 e 100 minutos.



Todos os pacientes tiveram boa evolução no pós-operatório imediato (30 dias), melhorando sua classe funcional, entretanto, 3 deles ficaram com insuficiência aórtica leve ou moderada após o terceiro ou quarto dias de pós-operatório. A pressão arterial, medida através de esfigmomanômetro no pré-operatório, foi comparada com o pós-operatório, e revelou níveis praticamente normais em todos os pacientes, imediatamente após a operação.

Os pacientes foram acompanhados em período pós-operatório tardio que variou entre 30 dias e 24 meses.

Quatro pacientes foram submetidos a estudo hemodinâmico no pós-operatório imediato. Em um deles não houve gradiente transvalvar aórtico, e, nos outros 3 pacientes, os gradientes encontrados foram de 9, 12 e 20 mmHg, este último supravalvar. Nenhum dos 4 pacientes tinha insuficiência aórtica ao exame (Figura 2).



Três (20%) pacientes desenvolveram insuficiência aórtica no pós-operatório, tendo sido necessária reintervenção cirúrgica. Um dos pacientes, com diagnóstico de ectasia ânulo-aórtica associada à insuficiência aórtica, evoluiu no pós-operatório imediato com insuficiência aórtica leve/moderada. Este paciente foi submetido ao teste de esforço (protocolo de Bruce), suportou carga máxima e conseguiu terminar o exame, portanto em classe funcional I (NYHA). Recebeu alta em boas condições clínicas, com pressão arterial de 130x60 mmHg. Após 10 meses, evoluiu com dispnéia aos médios esforços, dor precordial e pressão arterial de 180x30 mmHg, sendo reoperado para troca da valva aórtica. Um segundo paciente, portador de dupla disfunção aórtica e insuficiência coronária, que tinha sido submetido a remodelação e revascularização do miocárdio, apresentou insuficiência aórtica importante no segundo mês de pós-operatório. Este paciente foi submetido a nova intervenção cirúrgica, tendo sido trocada a valva aórtica. Havia rotura da sutura e a plicatura do anel estava solta. Evoluiu com distúrbio neurológico no pós-operatório tardio, falecendo. O terceiro paciente, um menino de 14 anos de idade, com diagnóstico de insuficiência aórtica pura, foi submetido a remodelação isolada e evoluiu com insuficiência aórtica importante após 3 meses de pós-operatório. O menor foi reoperado e encontrada rotura da plicatura da parede aórtica, provocando insuficiência aórtica paravalvar. Optou-se novamente pela conservação da valva aórtica motivada pelo bom diâmetro do anel e pelo aspecto normal das válvulas remanescentes. Porém, continua com insuficiência aórtica moderada, em acompanhamento clínico.

Durante o período de seguimento tardio, todos os pacientes estão em classe funcional (NYHA) melhor do que no pré-operatório. Dois deles têm insuficiência aórtica mínima e apenas um moderada. Não houve óbito imediato, apenas um tardio entre três que foram reoperados para tratar insuficiência aórtica.

COMENTÁRIOS

As características morfológicas da insuficiência aórtica dependem basicamente da etiologia do processo degenerativo que acomete a valva. A doença reumática, responsável por aproximadamente 46% dos casos de insuficiência aórtica isolada, provoca calcificação em apenas 10% dos casos e geralmente é focal. Mais freqüentemente, a doença reumática provoca retração que com o passar do tempo, leva a insuficiência central da valva aórtica (1,2).

A ectasia ânulo-aórtica produz vários graus de insuficiência aórtica, por vezes importante, entretanto suas válvulas são consideradas normais(4). Acredita-se que a doença cística da camada média cause dilatação da parede aórtica junto aos seios de Valsalva, e estendendo-se à aorta proximal, afaste as comissuras da valva aórtica, provocando insuficiência (1,4). A ectasia ânulo-aórtica, com ou sem dissecção, é responsável por aproximadamente 18% dos casos de insuficiência aórtica (4).

Dentre as etiologias mais freqüentes da insuficiência aórtica, podemos destacar também a doença valvar congênita, que ocorre em 13% dos casos, representada morfologicamente pela presença de valva aórtica bi ou univalvulada(1). Essas alterações podem provocar insuficiência aórtica por prolapso, serem agravadas pela ocorrência de endocardite ou comissurotomia inadequada (1).

Outras etiologias menos freqüentes perfazem aproximadamente 20% dos casos de insuficiência aórtica como endocardite nativa, doenças mixomatosas, aterosclerose, sífilis, aortites, rotura espontânea ou pós-trauma (1-5). Classicamente, o tratamento da insuficiência aórtica é a troca valvar por prótese artificial, biológica ou mecânica (1).

Várias técnicas e tipos de próteses valvares têm sido empregados para esse fim, desde 1957, quando Hufnagel implantou a primeira "prótese de bola" em aorta descendente (1). Atualmente, a maioria dos centros utiliza prótese mecânica com resultados favoráveis(5) . Entretanto, o tromboembolismo ocorre, ainda que, em algumas séries, com freqüência baixa (6,7).

As próteses biológicas têm sido uma opção bastante aceitável, mesmo levando-se em conta a deterioração que ocorre nos tecidos empregados para sua confecção(1,7). Devido às complicações decorrentes desses processos degenerativos que acometem as biopróteses, alguns autores recorrem às técnicas de preservação da valva aórtica(2-4), inclusive, em alguns casos, à bicuspidização(8-9), utilizada inicialmente entre 1958 e 1960 por GARAMELLA et al.(3), STARZL et al. (10), HURWITT et al. (11) revista, em 1966, por CABROL et al.(12), e, posteriormente, abandonada.

As técnicas atuais incluem plicatura das comissuras, redução do anel aórtico através de suturas, excisão de porção de uma ou mais válvulas redundantes e reconstrução por sutura (2-4,8,9).

Entretanto, as indicações e os resultados obtidos com essas técnicas ainda são inconclusivos. Como sabemos, as diversas etiologias pertinentes à insuficiência aórtica têm características distintas quanto a sua morfologia, e talvez possam ser utilizadas como critérios de indicação para preservação da valva aórtica. A técnica descrita neste trabalho foi por nós utilizada no primeiro paciente por existirem condições anatômicas favoráveis. A válvula não coronariana era menor que as outras duas, que tinham aspecto normal. Além disso, o anel aórtico tinha bom diâmetro. Em outro paciente havia dupla disfunção aórtica e calcificação de suas três válvulas. Após a descalcificação das mesmas, foi possível realizar a "Remodelação Cirúrgica da Valva Aórtica" com muita facilidade. O terceiro paciente tinha diagnóstico de ectasia ânulo-aórtica, sendo a redução do anel facilitada pelo seu maior diâmetro. Esse paciente apresentou insuficiência aórtica leve no terceiro dia de pós-operatório e no quinto dia evoluiu para insuficiência aórtica moderada causada por escape de ponto de sutura da aorta ascendente, conforme comprovado cirurgicamente quando foi submetido a troca valvar aórtica. Não houve óbito imediato nesta série de pacientes operados, nem ocorreram complicações extracardíacas. Apenas um paciente ficou com gradiente transvalvar de 20 mmHg. Entretanto, uma vez que esse paciente tinha 12 anos de idade e existindo tecido valvar nativo, é possível que as estruturas cresçam diminuindo o gradiente.Não houve insuficiência aórtica residual (Figura 1).

A insuficiência aórtica, que ocorreu em 3 casos por rotura de pontos, terá que ser resolvida, talvez com pontos da plicatura passados externamente à parede aórtica e ancorados em feltro de teflon.

Em conclusão, os autores acreditam que o método possa ser reproduzido com sucesso para alguns pacientes com valvopatia aórtica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 Kirklin J & Barrat-Boyes B - Cardiac surgery. Second Edition. New York: Churchill-Livingstone Inc, 1993: 560.

2 Cosgrove D M, Rosenkranz E R, Hendren W G, Bartlett J C, Stewart W J- Valvuloplasty for aortic insufficiency. J Thorac Cardiovasc Surg 1991; 102: 571-7.
[ Medline ]

3 Garamella J J, Andersen J G, Oropeza R, Veloso A, Naidu R - The surgical treatment of aortic insufficiency by open plastic revision of the tricuspid aortic valve to a bicuspid valve. Surg Gynec & Obst 1958; 106: 679-84.

4 Frater R W - Aortic valve insufficiency due to aortic dilatation: correction by sinus rim adjustment. Circulation 1986; 47(Suppl I): I-136-42.

5 Obadia J F, Tatou E, Lançon M H, Raoux R, Brenot R, David M - Les insuffisances aortiques post-traumatiques. Arch Mal Coeur 1991; 85: 211-4.

6 Arom K V, Nicoloff D M, Kersten T E, Lindsay W G, Northrup W F - St Jude medical prosthesis: valve related deaths and complications. Ann Thorac Surg 1987; 43: 591-8.
[ Medline ]

7 Blackstone E H & Kirklin J W - Death and other time related events after valve replacement. Circulation 1985; 72: 753-67.
[ Medline ]

8 Duran C, Kumar N, Gometza B, al Halees Z - Indications and limitations of aortic valve reconstruction. Ann Thorac Surg 1991; 52: 447-53.
[ Medline ]

9 Konstantinov B A, Dzemeshkevich S L, Ivanov V A, Sandrikov V A, Rikunov J - Long-term results of plastic reconstruction in acquired aortic valvular disease. J Cardiovasc Surg 1994; 35 (Suppl 1): 125-8.

10 Starzl T E, Cruzat E P, Walker B A, Lewis F J - A technique for bicuspidization of the aortic valve. Thorac Cardiovasc Surg 1959; 38: 262-70.

11 Hurwitt E S, Hoffert P W, Rosemblatt A - Plication of the aortic ring in the correction of aortic insufficiency. Thorac Cardiovasc Surg 1960; 39: 655-62.

12 Cabrol C, Cabrol A, Guiraudon G, Bertrand M - Le traitement de l'insuffisance aortique par l'annuloplastie aortique. Arch Mal Coeur Vaiss 1966; 59: 1305-12.



INTRODUÇÃO

O tratamento cirúrgico conservador da valva aórtica em pacientes com insuficiência valvar aórtica não tem resultado tão satisfatório quanto o da insuficiência mitral (1). Entretanto, as tentativas de preservação cirúrgica da valva aórtica são, na realidade, expressão das complicações que as próteses cardíacas valvares apresentam em sua evolução, tanto pelas limitações impostas aos pacientes que recebem próteses mecânicas, como pela possibilidade de reoperação para troca de prótese biológica que sofre processo degenerativo(2).

Assim sendo, métodos empregados na tentativa de preservação da valva aórtica devem ser considerados, padronizados e analisados a longo prazo. É o caso do presente artigo, que tem por objetivo relatar resultado de técnica de preservação da valva aórtica, utilizada primeiramente por GARAMELLA et al. (3), em 1958, e, posteriormente, abandonada.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

No período compreendido entre março de 1996 e julho de 1999 foram operados 15 pacientes portadores de disfunção valvar aórtica em nosso Serviço.

Quatro doentes tinham diagnóstico de insuficiência aórtica isolada, 2 com dupla disfunção aórtica associada à insuficiência coronária, 2 com doença da aorta ascendente, 4 com insuficiência aórtica e mitral, 1 com dupla disfunção aórtica e mitral, e 2 com insuficiência aórtica e insuficiência coronária. A idade dos pacientes variou entre 12 e 78 anos, sendo que 2 deles tinham idade inferior a 15 anos. Nove pacientes eram do sexo masculino.

O método empregado na correção cirúrgica da valvopatia aórtica foi denominado "Remodelação Cirúrgica da Valva Aórtica" e, conforme descrição de GARAMELLA et al. (3), consiste em utilização habitual de circulação extracorpórea, hipotermia moderada e infusão de solução cardioplégica nos óstios coronários. A válvula não coronariana é ressecada e é passado ponto ancorado nas comissuras correspondentes à válvula ressecada, de maneira que quando tracionado, torna a valva aórtica bivalvulada. O seio de Valsalva correspondente à válvula ressecada fica situado abaixo da "nova comissura". A parede da aorta torna-se evaginada, sendo suas bordas suturadas com monofilamento 5-0, continuamente, prosseguindo-se com a aortorrafia convencional (Figura 1).



RESULTADOS

Dos 15 pacientes operados no período, 6 foram submetidos à remodelação cirúrgica da valva aórtica como descrita no método, 2 foram tratados com remodelação e interposto enxerto tubular de pericárdio bovino, substituindo a aorta ascendente, outros 2 com remodelação da valva aórtica associada à revascularização do miocárdio, 1 com remodelação mais comissurotomia mitral e aórtica e os 4 últimos submetidos à remodelacão da valva aórtica e plástica da valva mitral (Tabela 1). Não houve óbito imediato. O tempo de circulação extracorpórea variou entre 47 e 122 minutos e o tempo de anóxia miocárdica entre 18 e 100 minutos.



Todos os pacientes tiveram boa evolução no pós-operatório imediato (30 dias), melhorando sua classe funcional, entretanto, 3 deles ficaram com insuficiência aórtica leve ou moderada após o terceiro ou quarto dias de pós-operatório. A pressão arterial, medida através de esfigmomanômetro no pré-operatório, foi comparada com o pós-operatório, e revelou níveis praticamente normais em todos os pacientes, imediatamente após a operação.

Os pacientes foram acompanhados em período pós-operatório tardio que variou entre 30 dias e 24 meses.

Quatro pacientes foram submetidos a estudo hemodinâmico no pós-operatório imediato. Em um deles não houve gradiente transvalvar aórtico, e, nos outros 3 pacientes, os gradientes encontrados foram de 9, 12 e 20 mmHg, este último supravalvar. Nenhum dos 4 pacientes tinha insuficiência aórtica ao exame (Figura 2).



Três (20%) pacientes desenvolveram insuficiência aórtica no pós-operatório, tendo sido necessária reintervenção cirúrgica. Um dos pacientes, com diagnóstico de ectasia ânulo-aórtica associada à insuficiência aórtica, evoluiu no pós-operatório imediato com insuficiência aórtica leve/moderada. Este paciente foi submetido ao teste de esforço (protocolo de Bruce), suportou carga máxima e conseguiu terminar o exame, portanto em classe funcional I (NYHA). Recebeu alta em boas condições clínicas, com pressão arterial de 130x60 mmHg. Após 10 meses, evoluiu com dispnéia aos médios esforços, dor precordial e pressão arterial de 180x30 mmHg, sendo reoperado para troca da valva aórtica. Um segundo paciente, portador de dupla disfunção aórtica e insuficiência coronária, que tinha sido submetido a remodelação e revascularização do miocárdio, apresentou insuficiência aórtica importante no segundo mês de pós-operatório. Este paciente foi submetido a nova intervenção cirúrgica, tendo sido trocada a valva aórtica. Havia rotura da sutura e a plicatura do anel estava solta. Evoluiu com distúrbio neurológico no pós-operatório tardio, falecendo. O terceiro paciente, um menino de 14 anos de idade, com diagnóstico de insuficiência aórtica pura, foi submetido a remodelação isolada e evoluiu com insuficiência aórtica importante após 3 meses de pós-operatório. O menor foi reoperado e encontrada rotura da plicatura da parede aórtica, provocando insuficiência aórtica paravalvar. Optou-se novamente pela conservação da valva aórtica motivada pelo bom diâmetro do anel e pelo aspecto normal das válvulas remanescentes. Porém, continua com insuficiência aórtica moderada, em acompanhamento clínico.

Durante o período de seguimento tardio, todos os pacientes estão em classe funcional (NYHA) melhor do que no pré-operatório. Dois deles têm insuficiência aórtica mínima e apenas um moderada. Não houve óbito imediato, apenas um tardio entre três que foram reoperados para tratar insuficiência aórtica.

COMENTÁRIOS

As características morfológicas da insuficiência aórtica dependem basicamente da etiologia do processo degenerativo que acomete a valva. A doença reumática, responsável por aproximadamente 46% dos casos de insuficiência aórtica isolada, provoca calcificação em apenas 10% dos casos e geralmente é focal. Mais freqüentemente, a doença reumática provoca retração que com o passar do tempo, leva a insuficiência central da valva aórtica (1,2).

A ectasia ânulo-aórtica produz vários graus de insuficiência aórtica, por vezes importante, entretanto suas válvulas são consideradas normais(4). Acredita-se que a doença cística da camada média cause dilatação da parede aórtica junto aos seios de Valsalva, e estendendo-se à aorta proximal, afaste as comissuras da valva aórtica, provocando insuficiência (1,4). A ectasia ânulo-aórtica, com ou sem dissecção, é responsável por aproximadamente 18% dos casos de insuficiência aórtica (4).

Dentre as etiologias mais freqüentes da insuficiência aórtica, podemos destacar também a doença valvar congênita, que ocorre em 13% dos casos, representada morfologicamente pela presença de valva aórtica bi ou univalvulada(1). Essas alterações podem provocar insuficiência aórtica por prolapso, serem agravadas pela ocorrência de endocardite ou comissurotomia inadequada (1).

Outras etiologias menos freqüentes perfazem aproximadamente 20% dos casos de insuficiência aórtica como endocardite nativa, doenças mixomatosas, aterosclerose, sífilis, aortites, rotura espontânea ou pós-trauma (1-5). Classicamente, o tratamento da insuficiência aórtica é a troca valvar por prótese artificial, biológica ou mecânica (1).

Várias técnicas e tipos de próteses valvares têm sido empregados para esse fim, desde 1957, quando Hufnagel implantou a primeira "prótese de bola" em aorta descendente (1). Atualmente, a maioria dos centros utiliza prótese mecânica com resultados favoráveis(5) . Entretanto, o tromboembolismo ocorre, ainda que, em algumas séries, com freqüência baixa (6,7).

As próteses biológicas têm sido uma opção bastante aceitável, mesmo levando-se em conta a deterioração que ocorre nos tecidos empregados para sua confecção(1,7). Devido às complicações decorrentes desses processos degenerativos que acometem as biopróteses, alguns autores recorrem às técnicas de preservação da valva aórtica(2-4), inclusive, em alguns casos, à bicuspidização(8-9), utilizada inicialmente entre 1958 e 1960 por GARAMELLA et al.(3), STARZL et al. (10), HURWITT et al. (11) revista, em 1966, por CABROL et al.(12), e, posteriormente, abandonada.

As técnicas atuais incluem plicatura das comissuras, redução do anel aórtico através de suturas, excisão de porção de uma ou mais válvulas redundantes e reconstrução por sutura (2-4,8,9).

Entretanto, as indicações e os resultados obtidos com essas técnicas ainda são inconclusivos. Como sabemos, as diversas etiologias pertinentes à insuficiência aórtica têm características distintas quanto a sua morfologia, e talvez possam ser utilizadas como critérios de indicação para preservação da valva aórtica. A técnica descrita neste trabalho foi por nós utilizada no primeiro paciente por existirem condições anatômicas favoráveis. A válvula não coronariana era menor que as outras duas, que tinham aspecto normal. Além disso, o anel aórtico tinha bom diâmetro. Em outro paciente havia dupla disfunção aórtica e calcificação de suas três válvulas. Após a descalcificação das mesmas, foi possível realizar a "Remodelação Cirúrgica da Valva Aórtica" com muita facilidade. O terceiro paciente tinha diagnóstico de ectasia ânulo-aórtica, sendo a redução do anel facilitada pelo seu maior diâmetro. Esse paciente apresentou insuficiência aórtica leve no terceiro dia de pós-operatório e no quinto dia evoluiu para insuficiência aórtica moderada causada por escape de ponto de sutura da aorta ascendente, conforme comprovado cirurgicamente quando foi submetido a troca valvar aórtica. Não houve óbito imediato nesta série de pacientes operados, nem ocorreram complicações extracardíacas. Apenas um paciente ficou com gradiente transvalvar de 20 mmHg. Entretanto, uma vez que esse paciente tinha 12 anos de idade e existindo tecido valvar nativo, é possível que as estruturas cresçam diminuindo o gradiente.Não houve insuficiência aórtica residual (Figura 1).

A insuficiência aórtica, que ocorreu em 3 casos por rotura de pontos, terá que ser resolvida, talvez com pontos da plicatura passados externamente à parede aórtica e ancorados em feltro de teflon.

Em conclusão, os autores acreditam que o método possa ser reproduzido com sucesso para alguns pacientes com valvopatia aórtica.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 Kirklin J & Barrat-Boyes B - Cardiac surgery. Second Edition. New York: Churchill-Livingstone Inc, 1993: 560.

2 Cosgrove D M, Rosenkranz E R, Hendren W G, Bartlett J C, Stewart W J- Valvuloplasty for aortic insufficiency. J Thorac Cardiovasc Surg 1991; 102: 571-7.
[ Medline ]

3 Garamella J J, Andersen J G, Oropeza R, Veloso A, Naidu R - The surgical treatment of aortic insufficiency by open plastic revision of the tricuspid aortic valve to a bicuspid valve. Surg Gynec & Obst 1958; 106: 679-84.

4 Frater R W - Aortic valve insufficiency due to aortic dilatation: correction by sinus rim adjustment. Circulation 1986; 47(Suppl I): I-136-42.

5 Obadia J F, Tatou E, Lançon M H, Raoux R, Brenot R, David M - Les insuffisances aortiques post-traumatiques. Arch Mal Coeur 1991; 85: 211-4.

6 Arom K V, Nicoloff D M, Kersten T E, Lindsay W G, Northrup W F - St Jude medical prosthesis: valve related deaths and complications. Ann Thorac Surg 1987; 43: 591-8.
[ Medline ]

7 Blackstone E H & Kirklin J W - Death and other time related events after valve replacement. Circulation 1985; 72: 753-67.
[ Medline ]

8 Duran C, Kumar N, Gometza B, al Halees Z - Indications and limitations of aortic valve reconstruction. Ann Thorac Surg 1991; 52: 447-53.
[ Medline ]

9 Konstantinov B A, Dzemeshkevich S L, Ivanov V A, Sandrikov V A, Rikunov J - Long-term results of plastic reconstruction in acquired aortic valvular disease. J Cardiovasc Surg 1994; 35 (Suppl 1): 125-8.

10 Starzl T E, Cruzat E P, Walker B A, Lewis F J - A technique for bicuspidization of the aortic valve. Thorac Cardiovasc Surg 1959; 38: 262-70.

11 Hurwitt E S, Hoffert P W, Rosemblatt A - Plication of the aortic ring in the correction of aortic insufficiency. Thorac Cardiovasc Surg 1960; 39: 655-62.

12 Cabrol C, Cabrol A, Guiraudon G, Bertrand M - Le traitement de l'insuffisance aortique par l'annuloplastie aortique. Arch Mal Coeur Vaiss 1966; 59: 1305-12.

Article receive on terça-feira, 1 de fevereiro de 2000

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