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ARTIGO ORIGINAL

Correção de comunicação interatrial com cirurgia minimamente invasiva em pacientes pediátricos

Roberto ROCHA-E-SILVA0; Luiz Fernando CANÊO0; Domingos D. LOURENÇO FILHO0; Sônia M. FRANCHI0; Cristina M. C. AFIUNE0; Carlos R. M. RODRIGUES SOBRINHO0; Amilcar O. MOCELIN0; Fabio B Jatene0

DOI: 10.1590/S0102-76381999000100010

INTRODUÇÃO

A cirurgia cardíaca realizada por esternotomia mediana é responsável por trauma cirúrgico que leva a seqüelas cicatriciais, particularmente indesejáveis em mulheres e crianças. Por este motivo, nos últimos anos estamos assistindo ao desenvolvimento de técnicas alternativas para obtenção de melhores resultados estéticos (1-8).

Entre estas técnicas a toracotomia lateral direita com abordagem pelo 4º espaço intercostal permite um bom acesso para a correção de comunicação interatrial em mulheres (9, 10). Embora obtenha um resultado estético satisfatório, acarreta maior dor no pós-operatório em relação à esternotomia mediana. O acesso transxifóideo (11) apresenta resultado estético adequado porém de mais difícil execução técnica necessitando em alguns casos de videotoracoscopia; sua realização implica ainda em incisão em região inguinal para canulação da artéria femoral. A correção cirúrgica de comunicação interatrial em crianças pode ser realizada através da esternotomia parcial (12, 13). Este acesso permite visão direta da aorta evitando-se a necessidade de auxílio de videotoracoscopia ou canulação da artéria femoral, preservando o objetivo de redução de seqüelas estéticas e, possivelmente, reduzindo a dor no pós-operatório. Este trabalho visa mostrar a nossa experiência no Hospital do Sepaco no tratamento da CIA através da esternotomia parcial.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

Em estudo prospectivo entre janeiro e novembro de 1998, foram realizadas 20 operações para correção cirúrgica de CIA através de esternotomia parcial. Quinze pacientes eram do sexo feminino e 5 do sexo masculino, com idade entre 3 e 12 anos (média: 7,1 ± 2,9 anos). Dos pacientes analisados 18 eram portadores de CIA tipo "ostium secundum" e 2 de CIA tipo seio venoso. Foram realizados 19 atriosseptoplastias com retalho de pericárdio do paciente e 1 atriosseptorrafia.

Técnica Operatória

O paciente é posicionado em decúbito dorsal horizontal com coxim no dorso. Incisão cutânea longitudinal de cerca de 6 cm sobre a metade inferior do esterno e esternotomia parcial (abertura do apêndice xifóide e corpo esternal, preservando o manúbrio). A flexibilidade do esterno nas crianças permite boa abertura sem risco de fratura; hemostasia do esterno e posicionamento do afastador "Finochietto" com sua base voltada cranialmente. O afastador é fixado em sua base com a extremidade de uma faixa estéril e através desta tracionado anterior e cranialmente; a outra extremidade da faixa é fixada sobre a cabeça do paciente na cabeceira da mesa cirúrgica (Figura 1). O pericárdio é aberto retirando-se um retalho circular de cerca de 4 cm de diâmetro. A abertura é ampliada cranialmente até cerca de 3 cm da veia inominada e caudalmente até o diafragma. Evita-se a manipulação do timo devido ao risco de formação de hematomas. Pontos de reparo de algodão 2-0 são fixados na borda do pericárdio. A veia cava superior e inferior são dissecadas e reparadas. Suturas em bolsa de prolene 5-0 são posicionadas nas veias cavas e na aorta. Heparina é administrada e em seguida a aorta e veias cavas superior e inferior são canuladas. Após o início da CEC e resfriamento do paciente a 28°C é realizado o pinçamento da aorta. O átrio direito é aberto através de incisão longitudinal. A proteção miocárdica é assegurada pela administração de cardioplegia sangüínea fria anterógrada através de cateter número 14 posicionado no bulbo da aorta. A atriosseptoplastia é realizada com o retalho de pericárdio do paciente com sutura contínua de prolene 5-0. Em alguns casos foi realizada a plastia de valva tricúspide por plicatura do anel com pontos separados de prolene 4-0 junto a uma ou mais comissuras. Realizadas manobras para a retirada de ar para abertura da pinça da aorta. Inicia-se o reaquecimento do paciente durante o fechamento do átrio direito com sutura contínua de prolene 5-0. Com o paciente aquecido e sem alterações de ritmo cardíaco, a CEC é descontinuada e o sangue reposto para posterior retirada das cânulas. Na etapa final da operação realiza-se a revisão de hemostasia, drenagem de mediastino, implante de marcapasso epicárdico em ventrículo direito, aproximação de epicárdio sobre a aorta com pontos separados de algodão 2-0 e fechamento do esterno com 4 fios de aço. Fechamento por planos de aponeurose, tecido celular subcutâneo e pele com sutura contínua de vicril 3-0.




Fig. 1 - Posicionamento do afastador com tração cranial para canulação da aorta; seta: tração cranial do afastador; AO: aorta; TP: tronco pulmonar.

RESULTADOS

A incisão cutânea sobre a metade inferior do esterno variou de 5 a 8 cm (média de 6 ± 1 cm). O tempo de CEC variou de 30 a 75 min (média: 48 ± 11 min). O tempo de isquemia variou de 12 a 50 min (média: 25 ± 8 min). O tempo cirúrgico variou de 125 a 195 min (média: 152 ± 24 min). O tempo de permanência do tubo orotraqueal variou de 3 a 17 horas (média de 7 ± 3 horas). O sangramento nas primeiras 12 horas variou de 40 a 230 ml (média de 120 ± 51 ml). Todos os pacientes foram submetidos a exame ecocardiográfico antes da alta hospitalar demonstrando correção de suas lesões com função miocárdica normal. Os pacientes receberam alta hospitalar entre o 5º e o 9º dia de pós-operatório (média: 5 ± 1 dias). Os resultados estão na Tabela 1.



COMENTÁRIOS

A toracotomia lateral direita pelo 4º espaço intercostal permite um bom acesso para a correção de comunicação interatrial, especialmente em mulheres. Em alguns casos pode haver diminuição de sensibilidade da mama. Na infância, quando ainda não desenvolveram as mamas e sem sulco delimitando o tecido mamário, a toracotomia lateral é desaconselhada pela possibilidade de deformação no desenvolvimento da mama e/ou incisão cutânea fora do local onde se formará o sulco mamário, prejudicando o resultado estético (14).

O acesso transxifóideo utiliza uma incisão longitudinal sobre o apêndice xifóide de cerca de 5 cm porém necessita, em alguns casos, de auxílio de videotoracoscopia pela sua dificuldade técnica. A artéria femoral deve ser dissecada e canulada para a CEC, o que implica em outra incisão na região inguinal.

A esternotomia parcial evitando a abertura do manúbrio mantém boa estabilização do esterno podendo resultar em diminuição da dor no pós-operatório em relação à esternotomia total. Nos casos estudados (crianças de 3 a 12 anos) não foi possível mensurar a dor. O acesso permite canulação da aorta sob visão direta (Figura 2), evitando-se a necessidade de auxílio de videotoracoscopia ou manuseio da artéria femoral. A técnica é simples e o tempo médio de sala operatória, de CEC e de isquemia miocárdica foram, respectivamente, 152 ± 24, 48 ± 11 e 25 ± 8 minutos. Em estudo retrospectivo dos últimos 10 pacientes pediátricos portadores de CIA operados com esternotomia total em nosso Serviço antes de iniciarmos este protocolo, o tempo médio de sala operatória, de CEC e de isquemia miocárdica foram, respectivamente, 159 ± 20, 49 ± 8 e 24 ± 8 minutos, não diferindo da esternotomia parcial (Tabela 2). A conversão em esternotomia total pode ser feita rápida e facilmente se for necessária, embora em nossa experiência não houve necessidade. A incisão cutânea longitudinal em média de 6 cm, deixa a cicatriz cirúrgica sobre a metade inferior do esterno, sem alteração da fúrcula esternal, permitindo assim um ótimo resultado estético (Figura 3).


Fig. 2 - Exposição adequada do átrio direito com as cânulas posicionadas; AD: átrio direito.




Fig. 3 - Paciente H.A.S. de 8 anos submetido à atriosseptoplastia com cicatriz incisional de 5,3 cm.

CONCLUSÃO

A cirurgia minimamente invasiva com esternotomia parcial em pacientes pediátricos é segura, dá bom acesso ao mediastino incluindo a possibilidade de conversão em esternotomia total se necessária, permite a canulação da aorta ascendente sob visão direta e dá ótimo resultado estético.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 King T D, Thompson S L, Steiner C, Mills N L - Secundum atrial septal defect: nonoperative closure during cardiac catheterization. JAMA 1976; 235: 2506-9.
[ Medline ]

2 Rome J J, Keane J F, Perry S B, Spevak P J, Lock J E - Double-umbrella closure of atrial defects: initial clinical applications. Circulation 1990; 82: 751-8.
[ Medline ]

3 Rao P S, Wilson A D, Chopra P S - Transcatheter closure of atrial septal defect by "buttoned" devices. Am J Cardiol 1992; 69: 1056-61.

4 Burke R P, Wernovsky G, van der Velde M, Hansen D, Castañeda A R - Video-assisted thoracoscopic surgery for congenital heart disease. J Thorac Cardiovasc Surg 1995; 109: 499-508.

5 Burke R P & Chang A C - Video-assisted thoracoscopic division of a vascular ring in an infant: a new operative technique. J Card Surg 1993; 8: 537-40.

6 Chang C H, Lin P J, Chu J J et al. - Video-assisted cardiac surgery in closure of atrial septal defect. Ann Thorac Surg 1996; 62: 697-701.

7 Tatebe S, Eguchi S, Miyamura H et al. - Limited vertical skin incision for median sternotomy. Ann Thorac Surg 1992; 54: 787-8.

8 Willman V L & Hanlon C R - Median sternotomy using a transverse submammary skin incision. Am J Surg 1960; 100: 170-84.

9 Rosengart T K & Stark J F - Repair of atrial septal defect through a right thoracotomy. Ann Thorac Surg 1993; 55: 1138-40.

10 Dietl C A, Torres A R, Favaloro R G - Right submammarian thoracotomy in female patients with atrial septal defects and anomalous pulmonary venous connections: comparison between the transpectoral and subpectoral approaches. J Thorac Cardiovasc Surg 1992; 104: 723-7.

11 Barbero-Marcial M, Tanamati C, Jatene M B, Atik E, Jatene A D - Transxiphoid approach without median sternotomy for the repair of atrial septal defects. Ann Thorac Surg 1998; 65: 771-4.

12 Wilson Jr W R, Ilbawi M N, DeLeon S Y, Piccione Jr W, Tubeszewski K, Cutilletta A F - Partial median sternotomy for repair of heart defects: a cosmetic approach. Ann Thorac Surg 1992; 54: 892-3.

13 Komai H, Naito Y, Fujiwara K et al. - Lower mid-line skin incision and minimal sternotomy: a more cosmetic challenge for pediatric cardiac surgery. Cardiol Young 1996; 6: 76-9.

14 Cherup L L, Siewers R D, Futrell J W - Breast and pectoral muscle maldevelopment after anterolateral and posterolateral thoracotomies in children. Ann Thorac Surg 1986; 41: 492-7.

Article receive on sexta-feira, 1 de janeiro de 1999

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