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ORIGINAL ARTICLE

Utilization of auto-expandable stents implanted through endoscopic vision in aneurysms of the thoracic aorta

José Honório Palma0; Nikolaus GEISTHÕVEL0; Luiz Antonio BRASIL0; Angelo FERRARI Jr.0; Antonio Carlos Carvalho0; Walter José Gomes0; Ênio Buffolo0

DOI: 10.1590/S0102-76381998000100003

ABSTRACT

This is a case report of a patient with two saccular aneurysms in the thoracic descending aorta. Treatment consisted of the positioning, through an opening in the aortic arch under deep hipothermia and total circulatory arrest, of two auto expandable stents, guided an Olympus endoscope. The bloodless field made possible the identification of the main thoracic and abdominal aortic branches facilitating the positioning and expansion of both stents. Immediate postoperative recovery was excellent. This is a previously unreported way of placing stents and could open a new perspective in the treatment of thoraco, abdominal and thoracic abdominal aortic aneurysms.

RESUMO

Tratamento de paciente com dois aneurismas saculares da aorta descendente, utilizando dois "stents" distintos, manufaturados sob medida tanto em comprimento quanto em diâmetro. Inseridos sob visão endoscópica com aparelho da marca "Olimpus" esterilizado com óxido de etileno, através de abertura na croça da aorta. O procedimento foi realizado por esternotomia mediana, com circulação extracorpórea, em hipotermia profunda e parada circulatória total. A manipulação endoscópica da aorta descendente, sem sangue, permitiu a identificação dos dois aneurismas, assim como a visão dos ramos principais da aorta e a inserção com expansão , na posição exata, dos dois "stents". A evolução pós- operatória foi satisfatória, sendo que este procedimento, inédito, abre uma nova perspectiva no tratamento dos aneurismas torácicos, toracoabdominais e abdominais.
INTRODUÇÃO

A angioscopia, método de utilização prática usado pela primeira vez na metade dos anos 80, com a fabricação de angioscópios de fibras ópticas de pequeno diâmetro, com melhor resolução, tornou-se procedimento de rotina na cirurgia vascular periférica e na radiologia intervencionista vascular.

As suas indicações ainda não são absolutas, variando com a experiência individual de cada instituição. A monitorização das formas mais recentes de procedimentos cirúrgicos endovasculares, a demonstração de seus mecanismos de ação e os efeitos sobre a parede vascular de dispositivos intervencionistas (angioplastia e aterectomia) são algumas de suas aplicações práticas. A utilização da visão endoscópica também se faz presente na complementação do diagnóstico das lesões vasculares, identificando a presença ou não de trombos, oclusão arteriosclerótica, êmbolos e placas ulceradas.

A imagem endoscópica da aorta foi relatada inicialmente, em 1957, por BROCK (1), que, utilizando um endoscópico rígido na croça da aorta, descreveu a visão dos vasos da base, durante intervenção na valva aórtica. Estudos experimentais em aorta de cadáveres e em cães vivos , descrevendo a luz vascular, foram realizados, em 1966, por GREENSTONE et al. (2), fazendo uso de um caleidoscópio de fibras ópticas flexíveis.

A introdução da técnica da Tromba de Elefante, em 1988 (3, 4), para tratamento das dissecções agudas da aorta descendente permitiu a resolução local do processo da dissecção, assim como diminuiu a mortalidade cirúrgica. Devido ao acúmulo de experiência com esta técnica (73 casos), surgiu a necessidade, já no centro cirúrgico durante a parada circulatória total, do diagnóstico de eventual tortuosidade da prótese, ou seu mau posicionamento. Havia casos, nesta casuística, onde a lesão da íntima não estava visível para o cirurgião e se apresentava mais distal na aorta descendente, surgindo a dúvida se a endoprótese estaria realmente ultrapassando o local da rotura da íntima, cumprindo, assim, o seu papel. Para dirimir esta dúvida e realizarmos com segurança a técnica da "tromba", utilizamos, em alguns casos selecionados, um broncoscópio esterilizado em glutaraldeído. A partir desta fase e com o desenvolvimento e aplicação dos "stents" endoaórticos em nossa Instituição, idealizamos a sua colocação cirúrgica, sob visão endoscópica, nas lesões mais distais na aorta descendente.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

O "stent" desenvolvido em nossa Instituição é confeccionado com fios de aço formando estruturas tubulares e modulares, recobertas de Dacron. Estes cilindros com fios de aço em "zig-zag" apresentam alta resistência ao colapso radial e mantêm a capacidade de retornar ao diâmetro com o qual foram construídos (memória). Estas próteses foram cuidadosamente comprimidas e inseridas em um cateter com diâmetro 22 F. Trata-se de um dispositivo auto-expansível que permite a sua liberação através de simples mobilização da bainha.

Trabalho experimental foi previamente realizado utilizando aortas frescas de cadáveres e um endoscópio gastrointestinal adulto da marca "Olimpus". Observamos neste estudo que era possível a identificação, com exatidão, dos vários ramos que saem da aorta (Figura 1), assim como também observadas com nitidez placas de cálcio na íntima ou lesões da parede criadas artificialmente. Tivemos a oportunidade de realizar, nesta fase, o estudo endoscópico de uma aorta de cadáver que apresentava um volumoso aneurisma verdadeiro em sua porção descendente. Neste caso, a solução de continuidade da parede, com trombos em seu interior, e os limites do aneurisma foram visibilizados com exatidão. Realizamos treinamento da inserção de "stents" nestas aortas, em suas diversas porções, e notamos que com facilidade pudemos observar e preservar a saída dos principais ramos (Figura 2).




Fig. 1 - (A e B) identificação, em aorta de cadáver, dos ramos renais e artéria mensentérica superior (à esquerda, 1A) e da bifurcação da aorta abdominal em ilíacas (à direita, 1B).


Fig. 2 - Colocação de "stent" em aorta de cadáver observando-se que, apesar da expansão do "stent", existe preservação da luz da artéria mensentérica.

A paciente de 67 anos, na qual utilizamos pioneiramente esta técnica, apresentava extensa e importante dilatação na parte inicial da aorta descendente, com outra dilatação menor na transição do terço médio para inferior da aorta torácica, conforme a aortografia (Figura 3). Construímos e esterilizamos, em óxido de etileno, dois "stents" distintos com tamanhos diferentes, previamente calculados de acordo com os exames realizados. O primeiro, que deveria recobrir a porção aneurismática após a subclávia esquerda, com 12 cm de comprimento e 2,8 cm de diâmetro e o segundo, com 6 cm de comprimento e o mesmo diâmetro, para ocluir o aneurisma mais distal.


Fig. 3 - Radiografia do tórax da paciente, demonstrando grande aneurisma vascular na porção inicial da aorta descendente torácica, além de um outro menor, na porção média da aorta torácica.

Esta paciente foi internada com dor torácica, por expansão do aneurisma, e apresentava, no pré-operatório, certo grau de insuficiência renal demonstrada por uma creatinina de 2,4 mg %.

A paciente foi submetida a esternotomia mediana. A circulação extracorpórea foi instalada com canulação da aorta ascendente e do átrio direito, sendo esfriada progressivamente até 18 graus centígrados. A incisão no arco aórtico foi feita em parada circulatória total, quando, então, iniciamos a aortoscopia utilizando o endoscópio gastrointestinal. A paciente, nesta fase, foi colocada em posição de proclive, sendo inserido um cateter de aspiração na aorta abdominal através da artéria femoral direita, com o objetivo de manter a luz da aorta vazia, sem sangue. A visão da luz da aorta iniciou-se na porção proximal da aorta descendente e o endoscópio foi sendo introduzido na aorta em sentido crânio-caudal. Após amplo exame intraluminal da aorta, identificamos os locais onde se fazia necessário o implante dos "stents", que foram introduzidos em seqüência, sendo liberados sem intercorrências. Finalizando o procedimento principal, reiniciamos a circulação extracorpórea com repetitivas manobras para evitarmos complicações decorrentes de embolias aéreas.

A aortoscopia realizada revelou trombos no interior dos dois aneurismas, bem como os ramos principais da aorta, assim como a bifurcação das artérias ilíacas. Por vezes, perdemos a visão momentânea em decorrência de sangue na lente do endoscópio, o que se resolvia com irrigação de soro fisiológico. Após o exame detalhado do interior da aorta, no qual gastamos cerca de 20 minutos, procedemos à colocação dos dois "stents", individualmente. Inicialmente, colocamos o cateter contendo a prótese de 6 cm no aneurisma mais distal, sendo que o ponto de referência para o início do processo de expansão e armação do "stent" foi a borda distal do aneurisma.

A segunda prótese de 12 cm foi também inserida seguindo os mesmos princípios, sendo realizada uma sutura proximal logo após a artéria subclávia esquerda (Figura 4). Após a liberação definitiva dos dois "stents", reintroduzimos o endoscópio passando-o através dos "stents" e confirmamos a eficácia do procedimento. O tempo gasto destas manobras, em parada circulatória total, foi de 32 minutos.


Fig. 4 - Imagem obtida da aortoscopia da paciente demonstrando o "stent" expandido no interior do aneurisma proximal.

A evolução pós-operatória na Unidade de Terapia Intensiva, onde permaneceu por dois dias, foi satisfatória, sem intercorrências. A radiografia simples de tórax demonstrou a posição exata dos "stents", colocados rigorosamente na zona dos aneurismas (Figura 5). A paciente obteve alta hospitalar após quatro dias de permanência na enfermaria sem apresentar qualquer sinal de hemólise.


Fig. 5 - Radiografia do tórax demonstrando o "stent" proximal e o distal.

COMENTÁRIOS

A endoscopia do sistema vascular evoluiu, no transcorrer dos últimos anos, de um procedimento experimental para uma técnica diagnóstica e terapêutica sofisticada, auxiliando até intervenções cirúrgicas ou percutâneas de artérias de pequeno e médio calibre nos dias atuais (5). Vários procedimentos intervencionistas foram sendo relatados, no decorrer dos últimos anos, relacionados com manipulação intraluminal das artérias, como, por exemplo, endarterectomia aorto-ilíaca (6), endarterectomia carotídea (7) e angioplastia por laser das coronárias (8).

A grande limitação da utilização da endoscopia nos vasos, sem dúvida, vem da grande quantidade de sangue no seu interior, o que impede sua visibilização adequada. Utilizando a parada circulatória total em hipotermia profunda, como propusemos, resolvemos de forma parcial este problema, tendo em vista que sempre existe um pouco de sangue no interior da aorta, vindo de seus ramos, o que não impede a realização dos procedimentos.

Serão sempre necessários treinamento e experimentação para conseguir a técnica suficiente e capacidade de interpretação, assim como para auxiliar na escolha da instrumentação apropriada. À medida em que esta utilização se tornar mais generalizada, poderá haver a tentação de se exagerar a capacidade da angioscopia na terapia. Lembramos que todo o esforço deve ser feito no sentido de tratarmos estes aneurismas e dissecções não complexas através de "stents" colocados via artéria femoral ou ilíaca, na sala de hemodinâmica. Poderemos, talvez no futuro, combinar a técnica de hipotermia profunda e parada circulatória total sem toracotomia, através de canulação da artéria e veia femoral, com a manipulação angioscópica nos laboratórios de hemodinâmica.

Após a introdução do conceito da correção dos aneurismas via percutânea, estabelecido por DOTTER (9), em 1969, e da primeira realização clínica feita, em 1991, por PARODI et al. (10) corrigindo um aneurisma de aorta abdominal, mais de 400 procedimentos envolvendo a colocação de "stents" na aorta abdominal foram realizados em todo o mundo (11). Nos últimos anos, a utilização dos "stents" tem proporcionado uma nova perspectiva no tratamento de várias doenças, como, por exemplo, os aneurismas e dissecções da aorta (12, 13), as complicações decorrentes das dissecções da aorta (14) e na doença oclusiva dos membros inferiores (15).

Com o aumento da experiência e técnica mais aprimorada, a aortoscopia poderá ocupar um lugar importante no tratamento de doenças complexas da aorta ou de lesões associadas, como a doença coronariana e aneurismas de aorta descendente ou abdominal. Em um mesmo ato cirúrgico, poderemos realizar pontes de safena durante o esfriamento do paciente e, após uma curta parada circulatória total, procederemos à aortoscopia com inserção de "stents". Prevemos em curto espaço de tempo a correção, com este método, dos aneurismas de toda porção toracoabdominal da aorta, colocando "stents" desde a sua bifurcação até a artéria subclávia esquerda, preservando as ramificações vistas pela aortoscopia, o que, seguramente, diminuirá as terríveis complicações observadas com a correção clássica feita por tóraco-freno-laparotomia (paraplegia, sangramento, insuficiência renal ou respiratória e tempo prolongado de internação).

Esta experiência pioneira, com sucesso, sugere que a colocação de "stent" sob visão endoscópica, na aorta, em associação com parada circulatória total e hipotermia profunda, abre uma nova perspectiva no tratamento destas doenças.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 Brock R C - Surgical treatment of aortic stenosis. Br Med J 1957; 1: 1019-28.

2 Greenstone S M, Shore J M, Heringman E C - Arterial endoscopy (arterioscopy). Arch Surg 1966; 93: 222-9.

3 Palma J H, Juliano J A, Cal R G R et al. - Tratamento dos aneurismas da aorta descendente por endoprótese (tromba de elefante). Rev Bras Cir Cardiovasc 1989; 4: 190-4.
[ Lilacs ]

4 Palma J H, Almeida D R, Carvalho A C, Andrade J C S, Buffolo E - Surgical treatment of acute type B aortic dissection using an endoprosthesis (elephant trunk). Ann Thorac Surg 1997; 63: 1081-4.

5 Mehigan J T & Olcott C - Video angioscopy as an alternative to intraoperative arteriography. Am J Surg 1986; 152: 139-45.

6 Vollmar J B & Storz L W - Vascular endoscopy: possibilities and limits of its clinical application. Surg Clin North Am 1974; 54: 111-22.

7 Towne J B & Bernhard V M - Vascular endoscopy: useful tool or interesting toy. Surgery 1977; 82: 415-9.
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8 Lee G, Ikeda R M, Dwyer R M - Feasibility of intravascular laser irradiation for in vivo visualization and therapy of cardiocirculatory diseases. Am Heart J 1982; 103: 1076-7.

9 Dotter C T - Transluminally placed coilspring endarterial tube grafts: long term patency in canine popliteal artery. Invest Radiol 1969; 4: 329-32.

10 Parodi J C, Palmaz J C, Barone H D - Transfemoral intraluminal graft implantation for abdominal aortic aneurysms. Ann Vasc Surg 1991; 5: 491-9.

11 Allenberg J R & Schumacher H - Endovascular reconstruction of infrarenal abdominal aortic aneurysm. Surgery 1995; 66: 870-7.

12 Dake M D, Miller D C, Semba C P, Mitchell R, Walker P J, Liddel R P - Transluminal placement of endovascular Stent-Grafts for the treatment of descending thoracic aortic aneurysm. N Engl J Med 1994; 331: 1729-34.
[ Medline ]

13 Marin M L, Veith F J, Panneta T F et al. - Transluminally placed endovascular Stent - Graft repair for arterial trauma. J Vasc Surg 1994; 20: 466-73.

14 Slonim S M, Nyman U, Semba C P, Miller D C, Mitchell S, Dake M D - Aortic dissection: percutaneous management of ischemic complications with endovascular stents and baloon fenestration. J Vasc Surg 1996; 23: 242-53.

15 Marin M L, Veith F J, Cynamon J et al. - Transfemoral endovascular stented graft treatment of aorto-iliac and femoropopliteal occlusive disease for limb salvage. Am J Surg 1994; 168: 156-62.

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