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HOMENAGEM

Ao Mestre, com carinho (1943-2010)

Rui M. S AlmeidaI

DOI: 10.1590/S0102-76382010000300024

Cirurgião cardiovascular e Professor Titular da Universidade Federal do Paraná (UFPr) e da Faculdade Evangélica do Paraná (FEPAR), Danton Richlin da Rocha Loures morreu a 20 de junho do corrente ano, inesperadamente, após um evento cardíaco, aos 66 anos de idade.

Conheci Danton Loures em 1977, durante seu concurso de livre docência, na Universidade Federal do Paraná. Pela vontade que tinha em vir a ser um cirurgião cardiovascular e pela impressão que ele me causou, ingressei na sua equipe como estagiário, no mesmo ano. Durante todos estes mais de 30 anos de convivência, tivemos uma relação professor/aluno, cirurgião/aprendiz, companheiros de trabalho e, acima de tudo, de amigos, que possuíam um profundo respeito um pelo outro.

Nascido em Joinville (SC), em 27 de outubro de 1943, filho do Dr. Josino e Carmen Rocha Loures, que mudaram-se para Londrina, por motivos profissionais, quando o menino tinha apenas quatro meses. Seu pai (papai, como o chamava) era otorrinolaringologista, o que influenciou Danton a cursar medicina na UFPr, mal sabendo que se tornaria um dos seus locais de labuta ao longos dos tempos. Desde o início, demonstrou um crescente interesse pela cardiologia, apesar de ter acompanhado seu pai por muitos anos. Durante o curso, foi incentivado pelo Prof. Acir Rachid a especializar-se em cirurgia cardiovascular.

No último ano do curso de Medicina (1968), casou-se com Regina Schrappe, com quem veio a ter quatro filhas.

Levado a São Paulo pelo Prof. Paulo Franco de Oliveira, pela sua ligação com o cardiologista Radi Macruz, ingressou no serviço do Prof. Zerbini, onde permaneceu até ao final do ano de 1971. Na sua volta, iniciou o serviço de cirurgia cardiovascular no antigo Hospital Santa Cruz, apoiado por seu mentor Zerbini, em termos de orientações e mesmo presenciais nas primeiras cirurgias e, após, no Hospital Evangélico de Curitiba (HEC). Incentivado e apoiado pelo Prof. Gastão Pereira da Cunha ingressou, desde a sua volta, na vida acadêmica na UFPR.


Prof. Dr. Danton Richlin da Rocha Loures



No início da década de 70, ao formar a sua equipe, contou desde o início com um grupo de estagiários que o ajudavam não só em cirurgia, como também no acompanhamento dos pacientes no pós-operatório imediato. Logo se juntaram mais três jovens cirurgiões (Paulo Roberto Brofman, Roberto Gomes de Carvalho e Edison José Ribeiro), dois dos quais realizaram sua formação em São Paulo (serviço do Prof. Zerbini), e o terceiro em Paris (serviço do Prof. Dubost). Este grupo de jovens cirurgiões iniciou seu trabalho no novo Hospital Evangélico de Curitiba e manteve a tradição de agregar estagiários à equipe, sendo que, durante todos estes anos, vários se tornaram cirurgiões cardiovasculares de destaque, dentro e fora do estado.

Sendo uma pessoa tranquila e de uma educação cirúrgica singular, tanto pela sua habilidade como pela destreza, conseguiu passar a seus discípulos o mesmo modo de trabalhar e princípios éticos de cirurgia. Esta, sem dúvida, foi um dos marcos de sua vida - a capacidade de agregar pessoas e de dar início a uma escola, ao formar novas gerações de cirurgiões cardiovasculares.

Danton era um cirurgião empreendedor e sempre com novos projetos em sua mente ou em execução. Desde o planejamento e execução de um centro cirúrgico até a realização de um transplante cardíaco, todos os detalhes eram cuidadosamente analisados e discutidos com todos os integrantes do grupo. O transplante era um sonho antigo, que se iniciou no sexto ano da faculdade, quando durante uma viagem à Europa soube da realização do primeiro transplante cardíaco mundial. Obcecado por esta ideia e persistente, como habitualmente, concretizou-a, em 1985, no HEC, quando foi um dos pioneiros da segunda fase de transplantes cardíacos no Brasil. Sendo um visionário, manteve este projeto em andamento, continuando-o no Hospital de Clínicas da UFPr.

Na universidade, incentivado pelo Prof. Gastão Pereira da Cunha, iniciou seus trabalhos ao participar da disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular, sob a responsabilidade do Prof. Iseu Elias Affonso da Costa. Ao longo destes anos, desenvolveu suas atividades acadêmicas, com uma participação ativa tanto no nível da graduação como na pós-graduação. Isto gerou convites para a participação em diversas bancas em várias instituições de ensino e em atividades científicas tanto nacionais como no exterior. Assumiu a chefia da cadeira de cirurgia torácica e cardiovascular em 1993 e há alguns anos concomitantemente a chefia do Departamento de Cirurgia. O último projeto que estava envolvido era o de células tronco, na UFPR. Era também professor da FEPAR, responsável pela cirurgia cardiovascular, por muitos anos, sendo sempre referência para futuros médicos como um profissional de destaque.

Neste trajeto de sua vida, teve importante papel na formação de uma série de cirurgiões cardiovasculares, aos quais dedicou o mesmo que houvera recebido de seu mentor o Prof. Zerbini. Visionário, é responsável pelo início de uma série de serviços no Paraná, hoje chefiados por seus discípulos.

Foi homenageado diversas vezes, tanto pela sociedade leiga, como em 1989, quando recebeu o título de cidadão honorário de Curitiba, como pelos seus pares, ao ingressar na Academia Paranaense de Medicina, ou pelos seus alunos ao ser homenageado como nome de turma.

Danton tinha uma enorme empatia com todos os que o cercavam, tanto em cirurgia, como na vida acadêmica, sempre se juntando a pessoas competentes, desde seus associados até seus colaboradores em projetos acadêmicos, mas também com seus pacientes, aos quais dedicava toda a sua atenção. Para estes, gostava de explicar todo o tratamento e o fazia com entusiasmo usando desenhos de sua autoria (Fig. 1) muito elucidativos.


Fig. 1 - Desenhos de Danton Rocha Loures. A) Coração normal; B) Persistência de Canal Arterial; C) Técnica de correção de Coarctação de Aorta com ligadura de Canal arterial



À parte de sua vida profissional, à qual dedicou muito do seu esforço, sempre foi um grande entusiasta por esporte e, juntamente com sua esposa Regina e suas filhas, realizava-os quase diariamente. Em função da perda da terceira filha, após uma cirurgia cardíaca para correção de uma Tetralogia de Fallot, realizada nos EUA, dedicou-se com entusiasmo ao tratamento cirúrgico das cardiopatias congênitas, sendo responsável pelo atendimento de um grande número de pacientes, estabelecendo a cirurgia cardíaca infantil no Paraná.

Portador de doença arterial coronariana e tendo anteriormente realizado alguns procedimentos terapêuticos, veio a falecer de mal súbito, durante a realização de exercícios físicos.

Deixa uma obra inacabada com toda a pujança de seu trabalho como professor, pesquisador e com mais de 25 mil cirurgias cardiovasculares.


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