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ARTIGO ORIGINAL

A ventriculotomia apical esquerda para tratamento cirúrgico da estenose mitral congênita

Miguel Barbero-MarcialII; Arlindo RisoII; Ângelo AlbuquerqueI; Edmar AtikI; Adib D JateneI

DOI: 10.1590/S0102-76381991000300005

Texto completo disponível apenas em PDF.



Discussão

DR. DÉCIO OLIVEIRA ELIAS
Maceió, AL

A estenose mitral congênita é uma lesão de difícil manuseio cirúrgico, pela variedade de componentes do aparelho mitral geralmente envolvida, anel, cúspides, cordoalha e músculos papilares, em associações as mais diversas. Em mais de 60% dos casos, está associada a outras lesões, principalmente a comunicação interventrícular, coarctação da aorta e dupla via de saída de ventrículo direto, o que também encontramos em nossa experiência. Podemos identificar na estenose mitral congênita: hipoplasia do anel mitral, espessamento das cúspides, ausência de comissuras, encurtamento ou fusão de cordas com obliteração fibrosa intercordal, anomalias de inserção das cordas, hipoplasia de músculos papilares, fusão dos papilares, músculo papilar único, músculos papilares múltiplos, e membrana fibrosa supravalvar. Carpentier simplificou a análise da estenose mitral congênita, classificando-a em dois tipos principais, conforme a presença ou a ausência de anomalias dos músculos papilares. Tipo A - músculos papilares normais: 1) fusão comissuro-papilar; 2) tecido valvar excessivo; 3) hipoplasia anular; 4) anel supravalvar. Tipo B - músculos papilares anormais: 1) músculo papilar (V. pára-quedas); 2) músculos papilares múltiplos (V. rede de dormir); 3) músculos papilares ausentes. No tipo A, em que os músculos papilares são normais, as alterações consistem em fusão das comissuras aos papilares, com ausência de cordas, excesso de tecido das cúspides, hipoplasia do anel mitral e a presença de um anel fibroso supravalvar que imobiliza as cúspides. O grupo B inclui a presença de um único papilar onde se inserem todas as cordas, livres ou fusionadas, e que caracteriza a "valva em pára-quedas", forma mais comum do grupo e encontrada em oito dos nove casos estudados pelos autores. Inclui, ainda, a existência de papilares múltiplos com inserção desordenada das cordas (valva em rede de dormir) e, finalmente, a ausência de papilares em que as cordas se inserem na parede ventricular. Para o tratamento da EMC dispomos de três métodos: 1) procedimentos reconstrutivos (plastias); 2) substituição valvar; 3) conduto valvado atrioventricular esquerdo. Procedimentos reconstrutivos, em que se busca ampliar a área valvar e, principalmente, a região subvalvar, criando comissuras, isolando cordas fusionadas ou dividindo o papilar único. Esses procedimentos devem ser adequadamente balanceados, de modo a resultar no menor grau possível de insuficiência mitral, o que foi conseguido com grande sucesso nos casos estudados pelos autores. Substituição da valva mitral. Indicada quando os procedimentos reconstrutivos não são aplicáveis ou quando a insuficiência mitral resultante da plastia é inaceitável. Em nossa pequena experiência de quatro casos, pudemos ressecar uma membrana fibrosa supravalvar e ampliar comissuras em apenas um caso, sendo os três restantes submetidos a troca da valva, dois dos quais por insuficiência mitral severa pós plastia, sem sucesso, e que foram a óbito por baixo débito cardíaco, no pós-operatório imediato. Quando o elemento obstrutivo mais importante é o anel mitral, com severa hipoplasia, a solução, via de regra, inclui o "bypass" da valva mitral por um conduto valvado extracardíaco, unindo o atrito e ventrículo esquerdos. Corno e colaboradores, em 1986, descreveram um caso de hipoplasia mitral, que trataram com um conduto valvado atriventricular esquerdo. Através da ventriculotomia apical esquerda, puderam visibilizar e examinar o papilar único da valva em pára-quedas hipoplásica. A adoção da ventriculotomia apical esquerda, como preconizada pelos autores para o manuseio dessa complexa lesão, sem dúvida, permite uma análise muito mais minuciosa e informativa do aparelho subvalvar, quando comparado com o acesso atrial convencional. O planejamento e a execução do tratamento reparador, como vimos durante a excelente apresentação, ficam extraordinariamente simplificados e permitindo aos autores a obtenção de resultados que não são igualados por outros métodos de tratamento. Agradecemos ao Dr. Miguel Barbero-Marcial e colaboradores ter partilhado conosco essa sua excelente e criativa experiência que, acreditamos, tornará a ventriculotomia apical esquerda a via de eleição para tratamento da estenose mitral congênita nas formas em que há anomalias das estruturas subvalvares.

Finalizando, gostaria de cumprimentar os autores, pela excelência dos resultados obtidos com o tratamento dessa difícil lesão e perguntar ao Dr. Miguel se, durante o período do estudo, outros pacientes com estenose mitral congênita necessitaram das outras formas de tratamento, como a substituição valvar, ou o conduto atrioventricular esquerdo.

DR. BARBERO-MARCIAL
(Encerrando)

Agradeço os comentários do Sr. Décio, que, de maneira precisa, nos apresentou todos os problemas e dificuldades que o cirurgião encontra, ao se propor tratar a estenose mitral congênita. Respondendo à sua pergunta, gostaria de dizer que os casos apresentados foram consecutivos e nenhum outro paciente portador dessa lesão foi operado por outra técnica. Mais uma vez, muito obrigado.

REFERÊNCIAS

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