Article

lock Open Access lock Peer-Reviewed

1

Views

ARTIGO ORIGINAL

Resultados atuais da cirurgia coronária em pacientes de alto risco

Pedro R SalernoI; Kassem A AscheI; Robert J CusimanoII; Samuel V LichtensteinII; Tomas A SalernoII

DOI: 10.1590/S0102-76381988000100006

Texto completo disponível apenas em PDF.



Discussão

DR. SÉRGIO ALMEIDA DE OLIVEIRA
São Paulo, SP

É uma honra comentar este trabalho, liderado pelo Dr. Tomás Salerno e muito bem apresentado pelo Dr. Pedro. É um tema de difícil abordagem, mas está baseado na angina instável, que, aqui, foi definida de maneira muito rigorosa, como sendo aqueles pacientes que, mesmo na terapia intensiva, sob medicação dilatadora e alguns com balão intra-aórtico, persistem nesse quadro isquêmico. Essa síndrome, como todos sabem, tem uma importância muito grande, porque está nitidamente relacionada a um infarto iminente, ou a morte súbita, e, clinicamente ela é caracterizada por 3 situações; seja a angina de recente começo, que evolui para uma situação dessa instabilidade, ou de uma angina crônica antiga que, num determinado momento, se instabiliza, ou, mesmo para a chamada síndrome intermediária, ela tem vários nomes, na literatura, e a angina instável passou a ser o mais comumente utilizado. (Slide) Este slide nos dá uma idéia. Este diagrama, tirado da literatura, nos dá uma idéia muito clara de uma teoria unitária para a insuficiência coronária. Nós sabemos que uma placa de ateroma pode sofrer alterações, na sua estrutura, geralmente uma hemorragia, levando à rotura do endotélio, que está em cima dessa placa e expõe o colágeno de carga positiva. Como as plaquetas são carregadas negativamente, forma-se um trombo, que pode evoluir para oclusão, a infarto, ou sofrer ações líticas por ação de agentes endógenos e voltar a uma situação de estabilidade, ou ficar num ciclo vicioso. Assim é que essa situação exige, nós sabemos, uma abordagem o mais precoce possível. Há muitos anos, desde o início da década de 70, nós trabalhamos para que o doente, numa situação estável, seja estudado o mais precocemente possível, discutido, e, hoje, os recursos são maiores, mais amplos, para que eles sejam tratados e não cheguem a essa situação de um grave comprometimento ventricular. O que não ficou muito claro, talvez, na definição do risco do doente, chamado de alto risco, é que a disfunção ventricular, aqui, muito bem expressa por fração de ejeção, pode ser enganosa, especialmente nessa situação, porque o doente com a angina, nós sabemos, tem um prognóstico bom; então, a disfunção ventricular é desencadeada por um processo isquêmico e a angina é a expressão máxima disso; pode ser uma situação reversível e, freqüentemente, é reversível. Então, quando temos um doente com 20% de fração de ejeção e com dor, este significado é completamente diferente do doente que tem 20% de fração de ejeção e está em insuficiência cardíaca e não tem dor. Juntar todos esses dados num grande grupo só fica um pouco difícil. Da experiência do Dr. Salerno, ficou muito claro que, nesse grupo, primeiro maior, nenhum tinha infarto definido como tal e, do grupo em choque cardiogênico, apenas 5 tinham infarto transmural. Tratava-se, na realidade, de um grupo com muita isquemia, um grupo grave, como nós sabemos, mas que poderá ter um prognóstico muito bom. A mensagem que eu deixo é que nós não devemos aguardar, passivamente, que a situação cheque a essa gravidade. É possível que uma integração maior entre o clínico e o cirurgião, ainda mais hoje em dia, em que se dispõe de muitos recursos, com o advento dos agentes trombolíticos, por exemplo, talvez se vá poder, primeiramente, evitar chegar a uma situação de disfunção ventricular grave, pelo abortamento do quadro agudo; em segundo lugar, estabelecer, em comum acordo com o clínico, a melhor opção terapêutica. Nos Estados Unidos, durante muito tempo e, talvez, conduzidos por informações da literatura, havia a idéia de que tratar um doente com angina instável era perigoso e oferecia alta incidência de infarto e alta mortalidade. Pohsso, o paciente era mantido em terapia intensiva e tratado exageradamente, até com balão intra-aórtico, para, só depois, num fracasso nessa tentativa de "esfriar", é que se encaminhava esse paciente à cirurgia, o que parece uma conduta inadequada. O trabalho aqui apresentado é excelente e, felizmente, conclui, acho, da mesma maneira que nós pensamos. Eu cumprimento os autores e o auditório, por ter assistido a esta excelente exposição. Obrigado.

DR. MIGUEL MALUF
São Paulo, SP

Gostaria, inicialmente, de cumprimentar o Dr. Pedro Salerno e colaboradores, pela excelência do trabalho, a expressividade que sua casuística e, ao mesmo tempo, agradecer à Comissão Organizadora deste congresso, pela oportunidade que dá para discussão do assunto. O rol da revascularização do miocárdio em pacientes com insuficiência coronária, sintomáticos e que apresentam disfunção ventricular esquerda, ou seja, miocardiopatia isquêmica, não está claramente definido. Os trabalhos publicados, nesta última década, mostram resultados favoráveis, pouco favoráveis, ou contraditórios, quanto à revascularização do miocárdio, neste grupo de pacientes. Provavelmente, esta controvérsia provenha de falta de uniformidade dos critérios que definem disfunção ventricular; além disto, a seleção de pacientes com miocardiopatia isquêmica, manifestada como angina, em lugar de disfunção por fibrose miocárdica, teve um efeito dramático sobre a mortalidade cirúrgica tardia. O autor deste trabalho enfatiza, criteriosamente, a indicação cirúrgica em pacientes com angina instável. A análise angiográfica da contração segmentar da parede do ventrículo esquerdo, como recomenda a classificação da American Heart Association (Circulation 51, Supl. 4:30, 1975), provém de critérios standard para determinar o estado funcional do ventrículo. Este método permite uma mais completa caracterização da função ventricular, mais que a fração de ejeção, ou Pd2 isoladamente, os quais são índices que refletem na função global do ventrículo. (Slide) A divisão, em 7 segmentos, do angiograma do ventrículo esquerdo, em posição OAD e OAE, e a avaliação da contração destes segmentos permitem classificar a função ventricular em 5 graus, sendo que o grau 5 tem 5, ou mais, segmentos hipo ou acinéticos; o grau 4 tem 3, ou mais, segmentos hipo ou acinéticos, e assim por diante. O autor usou a Canadian Classification, sendo que mais da metade dos pacientes estavam no grau III, ou IV. (Slide) Neste gráfico, observamos 2 grupos de pacientes portadores de miocardiopatia isquémica com disfunção ventricular, acompanhados durante 5 anos. O grupo clínico da Duke University, constituído por 1.214 pacientes, teve uma sobrevida de 89%, 70% e 38%, conforme a função ventricular foi normal, moderadamente, ou difusamente comprometida, respectivamente. O grupo cirúrgico da University of Western Ontario, constituído por 59 pacientes, teve uma sobrevida de 86%, provavelmente pela melhora da função ventricular. Este e outros trabalhos justificam a escolha do tratamento cirúrgico para este grupo de pacientes. Outro assunto que gostaria de comentar seria a proteção miocárdica, que, provavelmente, seja a chave dos resultados, neste grupo de pacientes. Nós não tivemos a oportunidade de pôr em prática os conceitos de Buckberg, no que se refere à proteção miocárdica e reperfusão, embora, baseado nesses trabalhos, o Dr. Ênio Buffolo tem realizado mudanças no nosso protocolo, como, por exemplo: a solução cardioplégica hiperpotássica gelada e usada na primeira injeção, dali por diante, passa a somente soro gelado sem potássio, cada 20 a 30 minutos, na raiz da aorta. Praticamos reperfusão do miocárdio, nos casos em que realizamos anastomose mamáriacoronária, ou seja, deixamos a mamária despinçada, nutrindo o miocárdio, à temparatura de 28ºC, antes de despinçar a aorta. Baixamos o fluxo da circulação extracorpórea por vários minutos, no momento de desclampear a aorta, e, nesse momento, iniciamos o aquecimento do paciente, enquanto realizamos as anastomoses proximais. Tomamos cuidado de não deixar entrar ar no sistema coronário e realizamos hiperfluxo ao fim da circulação extracorpórea, para garantir uma boa perfusão coronária. Saímos de extracorpórea sempre monitorizando as pressões de enchimento ventricular. Finalmente, a evolução dos pacientes que desenvolvem choque cardiogênico após infarte agudo do miocárdio não, necessariamente, deverá ser fatal. Cria-se a necessidade de um suporte circulatório adequado, com o uso de drogas vaso-ativas, ou mediante contrapulsação com balão intra-aórtico, até definir qual é o grupo de pacientes passíveis de benefício com a revascularização do miocárdio. Este critério foi, cuidadosamente, respeitado pelo autor, desde que 40% desses pacientes apresentavam lesão do tronco de coronária esquerda. Não há lugar a dúvidas de que as mortalidades operatória e pós-operatória imediata são altas, em decorrência do estado funcional do miocárdio, ou devido às condições clínicas do próprio paciente, como demonstram o trabalho aqui apresentado e outras publicações. (Slide) Para estes casos, tem surgido sistema de suporte mecânico temporário dos ventrículos esquerdo endireito, como mostra esta publicação da Universidade de Augusta, na Geórgia, onde 33 pacientes em choque caridogênico por diferentes motivos foram mantidos em circulação assisitda, até recuperar a função do ventrículo esquerdo, ou realizando um transplante cardíaco, conseguindo salvar 1/3 deles. Gostaria de conhecer a experiência do Dr. Salerno, neste assunto. Como já foi sugerido por outros autores, nós achamos que a mortalidade cirúrgica, em pacientes com disfunção ventricular, depende diretamente da seleção de pacientes, onde a angina é o sintoma predominante, indicando a presença de miocárdio potencialmente viável, e da exclusão de pacientes com disfunção ventricular com fibrose miocárdica irreversível. Muito obrigado.

DR. PEDRO SALERNO
(Encerrando)

Gostaria de agradecer os comentários feitos pelos Drs. Sérgio Oliveira e Miguel Maluf, bem como suas palavras elogiosas. Não há dúvida de que a ação do cirurgião, numa fase mais precoce do infarto do miocárdio, ou nos pacientes que estão nas condições de angina instável, é necessária. A experiência da Universidade de Toronto, com a assistência ventricular esquerda, é com a Biomedical Pump. Esta bomba é constituída por um módulo de controle de fluxo (ml/minuto), pressão (mm Hg), alarmes de proteção e por uma cabeça de infusão que possui, em seu interior, um imã. Através de uma cânula conectada ao átrio esquerdo, drena-se o sangue para a cabeça de infusão, que é reinfundido para a raiz da aorta, através de outra cânula. A experiência do St' Michel's Hospital da Universidade de Toronto constitui-se de 8 pacientes, nos quais o tempo de assistência ventricular variou de 12 a 24 horas. Os resultados não foram muito satisfatórios, já que 6 pacientes apresentaram assistolia, sendo, então, indicada a descontinuação da assistência ventricular e, nos outros 2, foi, também, descontinuada a assistência ventricular, por apresentarem parâmetros hemodinâmicos satisfatórios; porém, vieram a óbito, após 3 dias. Muito obrigado.

REFERÊNCIAS

1. ATHANASULEAS, C. L.; GEER. D. A.; ARCINIEGAS, J. G.; COOPER, T. B.; HESS, R. G.; MacLEAN. W. A. H.; PAPAPIETRO, S. E.; STANLEY. A. W. H.; McEACHERW, M, - A reappraisal of surgical intervention for acute myocardial infarction. J. Thorac Cardiovasc. Surg., 93(3): 405-414. 1987. [MedLine]

2. BUCKBERG, G. D.; DYSON, C. W.; EMERSON, R. C. - Techniques for administering clinical cardioplegia: blood cardioplegia. In: ENGELMAN. R. M. & LEVITSKY, S. eds. A textbook of Clinical cardioplegia. Mount Kisko. N. Y., Futura Publishing Co., 1982, p. 305-316.

3. HILL. D.; KEITH, W. J.; KELLY, J. J.; SELZER, A.; ARMSTRONG, W.; POPPER. R. W.; LANGSTON, M. F.; COHN, D - Emergency aortocoronary bypass for impeding or extending myocardial infarction. Circulation, 43(Supl. 1): 105-110, 1971.

4. KEON, W. J. - Surgery for acute myocardial infarction and cardiogenic shock. Cardiovasc. Rev. Rep., 2: 1120, 1981.

5. KILLIP III, T. & KIMBOLL, J. T. - Treatment ot myocardial infarction in a coronary care unit. Am. J. Cardiol., 20(4): 457-464, 1967. [MedLine]

6. MUNDTH, E. D.; BUCKLEY, M. J.; LEINBACH, R. C.; GOLD, H. K.; DAGGET. W. M.; AUSTEN, W. G. - Surgical intervention of the complications of acute myocardial ischemia. Ann. Surg., 178(3): 379-390, 1973. [MedLine]

7. ROSENKRANZ, E. R.; BUCKBERG, G. D.; LAKS, H.; WULDER, D. G. - Warm induction of cardioplegia with gIutamate-enriched blood in cirinary patients with cardiogenic shock who are dependent on inotropic drugs and intra-aortic balloon support, J. Thorac. Cardiovasc. Surg., 80(4): 507-518, 1983.

8. SILBER, E. N. - Heart disease. 2ed. New York, N. Y., MacMillan Publication Co., 1987. p. 1545.

CCBY All scientific articles published at bjcvs.org are licensed under a Creative Commons license

Indexes

All rights reserved 2017 / © 2024 Brazilian Society of Cardiovascular Surgery DEVELOPMENT BY