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RELATO DE CASO

Cisto pericárdico gigante: relato de caso

Vinicius José da Silva NinaI; Norman Colina Eduardo MANZANOII; Vinícius Giuliano Gonçalves MENDESIII; Natalino SALGADO FILHOIV

DOI: 10.1590/S0102-76382007000300013

RESUMO

Os cistos pericárdicos são anomalias congênitas incomuns, sendo a maioria assintomática e diagnosticadas incidentalmente na radiografia de tórax. Os cistos gigantes são raros, havendo poucos relatos concernentes à sua história natural, apresentação clínica e tratamento. No presente relato, os autores descrevem um caso de cisto pericárdico gigante, com sintomatologia compressiva importante, cuja excisão cirúrgica garantiu completa remissão sintomatológica no seguimento de 12 meses.

ABSTRACT

Pericardial cysts are uncommon congenital abnormalities. Most are asymptomatic and are found incidentally on chest roentgenograms. Giant cysts are an even more uncommon finding, and reports of their natural history, presentation and management are few. In this report the authors describe a case of a giant pericardial cyst with symptoms of mediastinal compression for which the surgical excision guaranteed a 12-month follow-up of complete remission of the symptomatology.
INTRODUÇÃO

Os cistos pericárdicos são formados pela coalescência incompleta da lacuna fetal durante a formação do pericárdio [1]. A incidência estimada do cisto pericárdico é 1:100000, sendo responsáveis por 6% a 7% das massas mediastinais relatadas na literatura [2]. Eles são tipicamente uniloculares e formados por endotélio ou mesotélio contendo líquido seroso claro. Estes cistos não se comunicam com o espaço pericárdico e, em mais de 50% dos casos, são assintomáticos. Usualmente, ocorrem mais em adultos, freqüentemente na terceira e quarta décadas de vida e raramente em crianças, sem preferência por sexo.

Dor torácica, dispnéia ou taquipnéia paroxística são sintomas que podem ser encontrados em 25 a 30% dos pacientes [1,2]. O achado radiológico mais comum é de uma lesão circular radiodensa homogênea no ângulo cardiofrênico direito em 2/3 dos casos [3]. Estes achados são suficientes para o diagnóstico, porém a sua confirmação deve ser obtida pela ecocardiografia bidimenssional, tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética [1-3]. O objetivo do presente relato é descrever um caso de excisão cirúrgica com sucesso de um cisto pericárdico gigante.


RELATO DO CASO

Paciente do sexo feminino, 46 anos, com história de seis meses de dispnéia progressiva aos esforços, dor torácica lateral direita e tosse seca, foi admitida no nosso serviço em bom estado geral, consciente, eupneica, acianótica, normocorada, anictérica e afebril. Ao exame do aparelho cardiovascular, o ritmo cardíaco era regular em dois tempos com bulhas cardíacas normofonéticas e sem sopros. A freqüência cardíaca era de 82 bpm e a pressão arterial de 110/70 mmHg. Na ausculta pulmonar, o murmúrio vesicular encontrava-se abolido nos dois terços inferiores do hemitórax direito.

A radiografia de tórax mostrava atelectasia dos lobos médio e inferior do pulmão direito.

O ecocardiograma foi sugestivo de cisto pericárdico, o qual foi confirmado pela tomografia de tórax e pela ressonância nuclear magnética, que demonstraram tratar-se de uma formação cística que media 13x9,5cm (Figura 1).


Fig. 1 - Ressonância nuclear magnética: grande estrutura cística de paredes finas contígua à borda cardíaca direita



Diante do quadro clínico e dos exames complementares, foi indicado tratamento cirúrgico. Após a obtenção do termo de consentimento livre e esclarecido, realizou-se a toracotomia lateral direita, com a excisão completa da massa mediastinal que media 14x10x0,3cm (Figura 2). O cisto encontrava-se preenchido por líquido citrino e aderido ao pulmão, nervos frênico e vago anterior e lateralmente, e ao esôfago, posteriormente. Após a drenagem em selo d'água da cavidade torácica, o procedimento foi concluído de maneira habitual. Não houve intercorrências no pós-operatório. A paciente recebeu alta cinco dias após a cirurgia.


Fig. 2 - Aspecto macroscópico do cisto pericárdico gigante



No seguimento ambulatorial de 12 meses, a paciente encontrava-se em completa remissão de sintomas, em classe funcional I (NYHA), e sem evidências imaginológicas de recorrência da massa mediastinal.

Análise bioquímica e histopatológica

O exame bioquímico do líquido confirmou tratar-se de um transudato. O exame histopatológico foi consistente com o diagnóstico de cisto pericárdico pela demonstração da presença de uma camada única de células cubóide-colunares, entremeadas por tecido fibroso, gordura e vasos.


DISCUSSÃO

Os cistos pericárdicos congênitos são incomuns e podem ter forma uni ou multilocular, com diâmetro variando entre 1cm e 5 cm [4]. No presente caso, tratava-se de um cisto multilocular com diâmetro de 10 cm, fazendo deste uma entidade ainda mais rara.

No diagnóstico diferencial devem ser considerados os tumores sólidos, incluindo angioma, lipoma, tumor neurogênico, sarcoma, linfoma, carcinoma broncogênico, metástase, lesão granulomatosa e abscesso. Outros cistos devem ser diferenciados, tais como cisto broncogênico intersticial e linfangiomas, além de outras doenças, como hérnias diafragmáticas e aneurismas cardíacos ou de grandes vasos [2,3].

O aspecto radiográfico mais usual dos cistos pericárdicos é o de uma massa arredondada, de bordas lisas e bem demarcadas, situada junto à margem cardíaca direita. Entretanto, o seu diagnóstico pode ser dificultado quando a lesão não se localiza no ângulo cardiofrênico direito; ou mais raramente como no caso aqui relatado, no qual a lesão era extensa e confluente com as estruturas mediastinais e acompanhava-se de sintomatologia [1,3].

A ecocardiografia é, em geral, suficiente para estabelecer o diagnóstico, entretanto, a tomografia computadorizada e a ressonância nuclear magnética contribuem para distinguir o cisto pericárdico de uma massa mediastinal sólida [2,4]. No entanto, o diagnóstico definitivo só se consolida por meio dos achados do exame anatomopatológico, conforme descritos pelos autores neste caso.

Em sua maioria, os cistos pericárdicos são assintomáticos. Ocasionalmente, podem alterar a hemodinâmica cardiovascular e/ou a expansibilidade pulmonar e produzir sinais e sintomas que simulem estenose tricúspide, estenose pulmonar ou pericardite constrictiva [3,4]. No presente relato, os sintomas de dispnéia, dor torácica e tosse ocorreram tipicamente pela compressão das estruturas mediastinais pelo cisto volumoso.

O tratamento para os cistos pericárdicos congênitos e inflamatórios é a aspiração percutânea e a esclerose com etanol. Caso não seja factível, a toracotomia videoassistida ou remoção cirúrgica podem ser indicadas, sobretudo nos pacientes sintomáticos com repercussões cardiorrespiratórias, como no caso que ora descrevemos [4].

Portanto, os cistos pericárdicos com características compressivas traduzidas por comprometimento hemodinâmico e/ou ventilatórios devem ser indicados para cirurgia. O tratamento conservador deve ser reservado para os casos assintomáticos; uma vez que o seguimento periódico em longo prazo tem demonstrado que estes pacientes não costumam desenvolver sintomas [1-4].


REFERÊNCIAS

1. Satur CM, Hsin MK, Dussek JE. Giant pericardial cysts. Ann Thorac Surg. 1996;61(1):208-10. [MedLine]

2. Caramori JE, Miozzo L, Formigheri M, Barcellos C, Grando M, Trentin T. Dispnéia por compressão de estruturas mediastinais por cisto pericárdico. Arq Bras Cardiol. 2005;84(6):486-7. [MedLine]

3. Carvalho ACP, Beze RS, Neves Filho AF. Cisto pericárdico: uma apresentação incomum. Radiol Bras. 2001;34(1):57-8.

4. Maisch B, Seferovic PM, Ristic AD, Erbel R, Rienmüller R, Adler Y, et al. Guidelines on the diagnosis and management of pericardial diseases executive summary. The Task force on the diagnosis and management of pericardial diseases of the European Society of Cardiology. Eur Heart J. 2004;25(7):587-610. [MedLine]

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