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ARTIGO ORIGINAL

A temperatura da pele pode ser um indicador para hemorragia grave no pós-operatório?

Sinasi ManduzI; Aydin ToktamisII; Ismail SapmazIII; Kasim DoganIV

DOI: 10.1590/S0102-76382006000400013

INTRODUÇÃO

O sangramento pós-operatório é uma complicação que pode ocorrer em pacientes que se submetem à cirurgia cardíaca e o uso da circulação extracorpórea (CEC) pode incrementar esse sangramento [1]. Há várias causas para o sangramento em pacientes que foram expostos à circulação extracorpórea, como consumo de fatores de coagulação, hemodiluição, alteração quantitativa e de função das plaquetas, hipotermia, resposta imune do hospedeiro na formação do complexo heparina-protamina e hemostasia cirúrgica inadequada [2]. Devido ao reaquecimento inadequado do corpo, os pacientes que se submetem à cirurgia cardíaca com CEC e hipotermia sistêmica freqüentemente estão com temperatura corpórea baixa após transferência à Unidade de Terapia Intensiva [3]. Alguns pacientes necessitam de re-intervenção devido ao sangramento no início do pós-operatório e muitas vezes a causa do sangramento na cirurgia pode não ser identificada [1-4]. Portanto, o objetivo deste estudo é avaliar a hipotermia residual pós-operatória e sua duração, assim como discutir se a hipotermia tardia pode ser um marcador de sangramento excessivo.

MÉTODO

Esta é uma revisão retrospectiva de 721 pacientes submetidos à cirurgia cardíaca eletiva, incluindo revascularização miocárdica, cirurgias valvares e procedimentos associados. Prontuários médicos de nossas clínicas do período de março de 1995 a março de 2005 foram examinados com critério e com a permissão da Comissão de Ética da Cumhuriyet University. Seiscentos e sessenta e dois pacientes foram operados com uso da CEC e 32 desses foram submetidos à re-exploração devido à perda sangüínea excessiva no pós-operatório. Foram excluídos 19 dos 31 pacientes devido a hemostasia inadequada, portanto foram estudados 12 pacientes sem nenhuma fonte localizada de sangramento cirúrgico. Por outro lado, o grupo controle foi formado com 16 pacientes tomados aleatoriamente e que foram submetidos à cirurgia com CEC, mas que não necessitaram de re-exploração e similar com o grupo de estudo de acordo com o tempo da CEC, TP, TTP e RNI no pós-operatório e valores de hemoglobina e plaquetas. A faixa etária do grupo de estudo variou de 48 a 60 anos e do grupo de controle de 29 a 68 anos.

Condições dos pacientes

Parâmetros hematológicos avaliados no pré-operatório de todos os pacientes incluíram tempo de protrombina (TP), tempo de tromboplastina parcial ativada (TTP), relação normalizada internacional (RNI), contagem de plaquetas e tempo de sangramento. O ácido acetilsalisílico (aspirina) foi interrompido sete dias antes do procedimento e os pacientes recebendo warfarina foram descontinuados também sete dias antes da operação. Todos os pacientes estavam recebendo heparina de baixo peso molecular 0,01 ml/kg até o dia da cirurgia. Os valores de TP, TTP, RNI estavam normais no pós-operatório em todos os pacientes. As contagens de hemoglobina e plaqueta foram similares entre os grupos.

Preparação para cirurgia, a cirurgia e unidade de terapia intensiva

A preparação anestésica dos pacientes foi feita por anestésico narcótico e todos os pacientes foram monitorados com linha intra-arterial e cateter venoso central. Uma dose inicial de heparina de 300 unidades por quilograma de peso foi administrada de forma intravenosa. O tempo de coagulação ativado (TCA) foi mantido acima do 400 segundos durante a circulação extracorpórea com heparina adicional se necessário. A CEC com bomba de roletes e oxigenador de membrana foi usada em todos os casos. O circuito da circulação extracorpórea foi preenchida com 1500 mL de uma solução de Ringer Lactate e sangue. A esternotomia mediana foi utiizada em todos os pacientes, a proteção do miocárdio foi feita com Plegisol® intermitente (Abbot) e cardioplegia sangüínea gelada. Todos os pacientes foram submetidos a hemodiluição moderada (hematócrito entre 19%-24%) e hipotermia (28-32 graus Celsius). Após a cirurgia os pacientes foram reaquecidos até uma temperatura acima de 35 graus centígrados. A protamina HCI ® foi usada para normalizar o TCA (1 UI por cada 42 UI de heparina). Foi administrada uma dose adicional de protamina de 30 mg, caso o TCA se mantivesse alterado. Os pacientes foram transferidos do centro cirúrgico à Unidade de Terapia Intensiva com completo monitoramento.

Os pacientes estavam envolvidos em cobertores cheios de ar quente e circulação de ar quente foi fornecida com uma bomba de ar quente (Warmtouch®). Do primeiro minuto na unidade de terapia intensiva, todos os parâmetros vitais inclusive pressão venosa central, pulso, pressão arterial, temperatura da pele foram anotados. O eletrocardiograma (ECG) e radiografia do tórax foram realizados na primeira hora. Todos os parâmetros foram anotados cada trinta minutos rotineiramente, exceto o ECG e a radiograma do tórax. A temperatura da pele, medida na região axilar, foi verificada com termômetro de vidro com mercúrio.

Para todos os pacientes, o tempo entre a entrada na unidade de terapia intensiva até a temperatura de pele atingir os 36,5 graus centígrados foi medido e anotado. A temperatura da pele do grupo que foi submetido à re-exploração foi anotada junto com as medições dos níveis TCA pré-operatório, aferidos por tubos Actalyke e foram examinados em ambos os grupos, de controle e de estudo. A duração da CEC foi anotada no prontuário e a temperatura mais baixa durante as operações foi registrada.

Critérios de re-exploração

A decisão para re-explorar foi feita baseada na taxa de sangramento no pós-operatório e no volume acumulado. Os pacientes foram explorados quando apresentaram sangramento numa taxa de 200 ml/hora por mais que 4 horas ou por um aumento súbito de sangramento após as primeiras duas horas. Por outro lado, anúria sem causa aparente e alargamento mediastinal nas radiografias do tórax sugerindo tamponamento cardíaco devido ao sangramento foram aceitos como motivo para re-exploração.

Analise estatística

As análises de dados foram realizadas usando o software SSPS versão 10.0 e o teste U de Mann- Whitney. O valor de p<0,05 foi aceito como significante.

RESULTADOS

A temperatura da pele de todos os pacientes estava abaixo de 35 graus centígrados nos primeiros minutos depois da entrada na Unidade de Terapia Intensiva. A média de duração da CEC entre os dois grupos não foi significativa (p= 0,417). O tempo da entrada na unidade de terapia intensiva até a temperatura de pele atingir os 36,5 graus Celsius foi significantemente mais longo no grupo de estudo (z = 4,618, p=0001) . A comparação entre os dois grupos em respeito das temperaturas mais baixa na cirurgia não foi significativa (p= 0,157). As diferenças de níveis do TCA pré-operatório e pós-operatório entre grupos de controle e de estudo também não foram significantes (Tabela 1).



DISCUSSÃO

O sangramento no pós-operatório é um problema sério em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca com CEC. Esse sangramento é curioso, visto que a re-exploração freqüentemente não se encontra nenhuma causa aparente de sangramento [4].

Em nossos dez anos de experiência, uma hipotermia tardia chamou a nossa atenção em pacientes que necessitaram de re-exploração por causa de sangramento e nenhuma causa do sangramento foi encontrada. O estudo feito por Lahtinen et al. nos encorajou a desenvolver esta análise, quando eles mostraram correlação entre volume de sangramento no pós-operatório e temperatura baixa da artéria pulmonar [5]. Nathan et al. relataram que a intensidade da hipotermia é um parâmetro importante para sangramento no pós-operatório [6]. Estes achados impulsionaram este estudo, onde foi extraída a temperatura mais baixa dos pacientes no peri-operatório e feita a comparação.

Nossa investigação mostrou que a duração da temperatura da pele baixa é significantemente mais longa em pacientes que tiveram maior sangramento.

A temperatura mais baixa da pele poderia ser a causa do sangramento de nossos pacientes. Entretanto essa afirmação ainda carece de maior estudo, já que outros fatores podem também interferir, como o débito cardíaco, que pode também alterar a coagulação sangüínea [5]. Como a medida do debito cardíaco não é parte rotineira do cuidado pós-operatório em nosso serviço, e este estudo foi retrospectivo, esse dado não pode ser correlacionado.

CONCLUSÕES

Em nosso estudo, a temperatura da pele dos pacientes que necessitaram re-exploração cirúrgica estava mais baixa no pós-operatório. Isso é causa ou conseqüência? A re-exploração poderia ser prevenida se os pacientes fossem reaquecidos adequadamente? Essa hipotermia tardia pode ser uma indicação de sangramento excessivo? Nossos estudos posteriores poderão ajudar a esclarecer este interessante achado.

AGRADECIMENTOS

À assistência técnica de nossa perfusionista, Sra. Aysel Keskin.

REFERÊNCIAS

1. Hall TS, Brevetti GR, Skoultchi AJ, Sines JC, Gregory P, Spotnitz AJ. Re-exploration for hemorrhage following open heart surgery differentiation on the causes of bleeding and the impact on patient outcomes. Ann Thorac Cardiovasc Surg. 2001;7(6):352-7.

2. Inada E. Blood coagulation and autologous blood transfusion in cardiac surgery. J Clin Anesth. 1990;2(6):393-406.

3. Marelli D, Chiu RC, Fleiszer DM, Brown RA. Residual hypothermia in patients recovering in the intensive care unit from cardiac surgery. Can J Surg. 1988;31(6):434-6.

4. Salenger R, Gammie JS, Vander Salm TJ. Postoperative care of cardiac surgical patients. In: Cohn LH, Edmunds LH Jr, eds. Cardiac surgery in the adult. New York:McGraw-Hill;2003. p.439-69.

5. Lahtinen J, Biancari F, Ala-Kokko T, Rainio P, Salmela E, Pokela R, et al. Pulmonary artery blood temperature at admission to the intensive care unit is predictive of outcome after on-pump coronary artery bypass surgery. Scand Cardiovasc J. 2004;38(2):104-12.

6. Nathan HJ, Parlea L, Dupuis JY, Hendry P, Williams KA, Rubens FD, et al. Safety of deliberate intraoperative and postoperative hypothermia for patients undergoing coronary artery surgery: a randomized trial. J Thorac Cardiovasc Surg. 2004;127(5):1270-5.

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